Entrevista: Passada a tormenta, a Feraesp busca transitar por outros caminhos.

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Nascido em São João do Piauí, Jotalune Dias dos Santos, “Jota”, se mudou para São Paulo ainda pequeno e, quando adolescente, foi para o interior trabalhar no campo, primeiro em uma fazenda de gado e depois como cortador de cana-de-açúcar. Militante sindical e social desde os vinte e poucos anos foi eleito recentemente presidente da Federação de Empregados e Assalariados Rurais do Estado de São Paulo (Feraesp). “Jota” conversou com A Rel sobre os desafios que implica fundar novamente a organização, agora sob novos pilares.

-Você assumirá em um contexto bastante complexo para a Federação…
-É certo. Estamos num momento delicado com a destituição do presidente anterior por suspeita de desvio de recursos, o que foi comprovado posteriormente por uma auditoria externa.

Agora temos a difícil missão de reunir novamente vários sindicatos que saíram da Feraesp para retomar um projeto que havia sido perdido ao longo desse tempo.

-Além do desvio de fundos, que outros erros não podem ser repetidos?
-Queremos construir uma federação verdadeiramente democrática e inclusiva, sem enganar os trabalhadores e os dirigentes, fazendo um trabalho com eles e não para eles.

Uma federação onde o trabalhador e a trabalhadora sejam partícipes do projeto desde o começo, uma construção coletiva.

-Em sua opinião, a administração anterior desconsiderou o poder da base?
-Sem dúvida. Isso ficou claro no período anterior. Nenhuma organização existe graças a uma só pessoa, por mais brilhante que seja, isso é inviável.

As grandes organizações se nutrem de suas bases, dos seus trabalhadores e trabalhadoras e nós, dirigentes, devemos fazer o exercício diário de aprender com todos. Deixar de lado a arrogância e escutar as pessoas, estar ao seu lado em seus problemas e desafios.

-Eu imagino que, para levar adiante este novo projeto, várias coisas terão que mudar.
-Temos que mudar posturas, processos, a forma, os acordos, reunir uma boa equipe, qualificada, responsável e comprometida com a tarefa que pretendemos desenvolver.

Foram feitas muitas coisas boas no período anterior também, em que pese os erros. O que buscamos agora é unificar o bom para dar continuidade e mudar o que não funciona.

Gerar maior indignação
Reconstruir o trabalho sindical

-Apesar da crise do movimento sindical, eu percebo um grande entusiasmo de vocês pela continuidade do projeto da Feraesp. A que se deve este estado de ânimo?
-A ressaca moral pela qual passa o movimento sindical brasileiro é terrível e a Feraesp não estava alheia a ela.

Devo confessar que muitos dos dirigentes que estão de nosso lado, com o propósito renovado de voltar a construir esta Federação, já tinham perdido a fé no movimento sindical, já tinham jogado a toalha.

Por sorte, nosso grupo conseguiu gerar indignação, que é o motor de toda mudança, e pudemos convocá-los para nos acompanharem neste novo caminho e se sintam motivados por este novo projeto, tanto como nós estamos.

Muitos destes companheiros que estavam como mortos-vivos, desesperançados, estão renascendo como dirigentes sindicais com este projeto de federação que queremos levar adiante. É isso o que faz com que o nosso trabalho valha a pena.

-Com a esperança intacta?
-Certamente. Mas, sem muitas ilusões. Estamos conscientes das dificuldades que enfrentamos e da conjuntura atual do país, porém acreditamos que com a experiência que temos, e aprendendo com os nossos erros, poderemos melhorar as coisas.